quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

QUEM COMEU "MARIA PORQUINHA"?

Texto de Aloisio Guimarães


A vida é cheia de passagens hilárias, embora existam momentos de profunda tristeza. Conto-lhes, a seguir, um desses momentos cômicos da minha infância, tendo como personagem o meu irmão mais velho, Luiz Antônio - "Lutonho", para a família - em confronto com o temperamento e o rigor que tinha o velho Aloisio "Gordinho”, o nosso saudoso pai, na nossa educação e formação moral
Vamos ao causo...
Nos meados da década de 70, em Palmeira dos Índios, próximo à agência dos Correios e Telégrafos, vizinho à oficina mecânica do saudoso Dudé, morava Geraldo "Patinha”, um sujeito avermelhado, cara de castanha, epiléptico, bastante nervoso e sempre molhado de suor e com a barba para fazer. O Geraldo "Patinha” gostava de tomar umas biritas e diariamente frequentava o “Senadinho” - o bar do meu pai, que ficava vizinho ao Aeroclube - o principal clube social da cidade.
Até hoje não sabemos porque cargas d’águas, o nosso pai colocou este apelido no cara; talvez, motivado por algum imbróglio do dito cujo com alguma patinha de siri, um tira-gosto muito popular nos bares alagoanos.
Naquela época, trabalhava na casa do “Patinha” uma empregada doméstica, muito baixinha, bem gordinha, fedorenta e feia pra cacete! E como a turma não perdoa nada, colocaram o apelido na sujeita de Maria "Porquinha”, numa clara alusão à figura do suíno. Portanto, meu amigo, se alguém, um dia, mandar você imaginar uma pessoa horrível, a resposta é Maria "Porquinha”.
Era do conhecimento da rapaziada da cidade (Luiz Antônio, Jazon, João Canfifa, Tadeu Cavalcante...) que, à noite, nas suas horas vagas, ao término da sua jornada de trabalho, Maria "Porquinha” costumava "fazer bico” como “piniqueira” - como eram chamadas aquelas empregadas domésticas que “davam” em troca de uma besteira qualquer, fosse um maço de cigarros, um perfume comprado na feira ou até mesmo um sabonete Palmolive. Agora, cá para nós, era preciso ter “muita fome” ou muita “cachaça no rabo” para um sujeito aguentar comer Maria "Porquinha”!
Pois bem, certa noite, aproveitando a ausência dos donos da casa e “subindo pelas paredes”, a Maria "Porquinha”, inventou de fazer uma suruba, justamente na residência do seu patrão e, pior ainda, na cama do casal. E não é que, “bobeada” ou “anestesiada” com tanto amor que recebeu ao mesmo tempo durante a noite, a Maria "Porquinha” se esqueceu de limpar os vestígios de espermatozoides que ficaram nos lençóis da cama, após o fervoroso bacanal! Aí, meu amigo, foi o fim do mundo. Ao chegar de viagem e ao se deparar com a bagunça no seu quarto, Geraldo "Patinha”  ficou possesso e foi logo perguntar ao seu amigo Dudé - o dono da oficina, seu vizinho - se ele tinha visto alguma coisa de anormal ou viu alguém entrar na sua residência, quando ele estava viajando. Como resposta, Dudé lhe informou:
- Geraldo, a única coisa que eu vi foi o filho do Aloisio "Gordinho”, em altos papos com a Maria "Porquinha”, no portão da sua casa...
Pronto, explodiu uma bomba no “Senadinho” - o bar do meu pai - quando “Patinha” foi tomar satisfações com ele e com meu irmão, ameaçando todo mundo.
Indignado com a acusação do sujeito, papai chamou meu irmão e perguntou, aos berros:
- Luiz Antônio, você comeu Maria "Porquinha”?! Você comeu a “Porquinha”, Luiz Antônio?!...
Pela entonação da sua voz, talvez papai pensasse até que o Luiz Antônio ainda fosse “donzelo”. Coitado do meu irmão...
Nesse momento fiquei encucado porque jamais tinha ouvido uma expressão daquela. Até então, não sabia que "mulé se comia". Inocente, eu sabia apenas que se comia feijão, arroz, cuscuz... Mas "mulé", nunca tinha ouvido falar! 
Ao ouvir os gritos do papai, cabisbaixo, pálido e pasmado, a resposta de Luiz Antônio foi uma negativa:
- Não, papai, eu não comi a “Porquinha”. Apenas, eu vinha descendo da Festa de Natal, na Praça da Independência, e ela me pediu um cigarro...
Puta que pariu! E não é que nessa hora o Luiz Antônio esqueceu que o nosso pai detestava cigarro mais do que tudo na vida, tanto que, ao ouvir a sua justificativa, papai ficou possesso de raiva e nem deixou meu irmão continuar:
– Cigarro?! E você fuma, Luiz Antônio?!
Ao mesmo tempo em que proferia a indagação, papai sapecou um tabefe no “escutador de novelas” do meu irmão, sem ter dado tempo dele responder se tinha ou não comido a “Porquinha”. Até hoje, quando Luiz Antônio se lembra do tapa que levou nessa hora, o ouvido esquerdo dele começa a zumbir...
Profundamente magoado e irritado com a invasão da sua casa, “Patinha” levou o caso à Promotoria Pública, denunciando meu irmão de vários delitos. Mas, graças à interferência do saudoso ícone da literatura palmeirense Luiz B. Torres, irmão do renomado promotor José Torres e padrinho de Luiz Antônio, a ocorrência foi amenizada na sua denúncia.
Nesse intervalo, para não ser preso, o meu irmão teve que passar uns dias fora da cidade, escondido em Minador do Negrão, em casa de parentes, até que os amigos do nosso pai domassem o Geraldo "Patinha”. E nada melhor do que o tempo para curar todas as feridas: o “Patinha” retirou a queixa, deu o caso por encerrado, mas sobrou para a coitada da “Porquinha”: perdeu o emprego.
Durante muitos anos, o meu irmão ficou conhecido na cidade como “Luiz, O Comedor de Porquinhas”. A verdade é que, entre “patinhas” e “porquinhas”, o “cacete comeu” no pé de ouvido do meu irmão que, até hoje, nega ter sido o “porco” que comeu a “Porquinha”.
Deste episódio da minha infância, duas perguntas, ainda não respondidas, tiram o meu sossego:
- Por que será que “Lisontonho” é louco por carne de porco? E se ele diz que não comeu, quem peste comeu Maria "Porquinha”?

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