sábado, 13 de novembro de 2021

A TEORIA DO MERTHIOLATE

Texto de Murilo Gun

Na minha infância, as crianças eram mais calmas. Sabe por quê? Porque o Merthiolate ardia muito. As crianças de vez em quando deixavam de fazer merda pensando no Merthiolate. O Merthiolate tinha uma função pedagógica. O Merthiolate também tinha uma função psicológica. Porque aquele ardor dava a impressão de que os micróbios estavam sendo mortos. Você acreditava que de fato estava curando. Mercúrio Cromo não ardia, então dava a sensação que curava menos. Quando o Merthiolate encostava na ferida, você sentia que ali tinha virado um grande campo de batalha. Você sentia o ardor da guerra. E quando o ardor passava é porque a gente tinha conseguido vencer o mal.
Além do fator pedagógico e psicológico, o Merthiolate também tinha um apelo maternal. Porque a única coisa capaz de amenizar o sofrimento do Merthiolate eram as micropartículas de saliva materna. Quando a mãe soprava na ferida, o sofrimento magicamente reduzia.
Além do fator pedagógico, psicológico e maternal, o Merthiolate também tinha uma função de geolocalização. Porque o ardor servia como sinalização se o Merthiolate tinha sido de fato colocado no local correto. Se não ardesse, é porque não colocou direito. O Merthiolate era o GPS da ferida.
Além do fator pedagógico, psicológico, maternal e de geolocalização, o Merthiolate também teve um impacto na personalidade das pessoas. O ardor incrível do Merthiolate moldou a personalidade da geração de crianças dos anos 80. As crianças desde cedo se acostumaram a ser homem, engolir choro, aguentar dor...
Hoje em dia, o Merthiolate não arde mais! Por isso essa “geração emo”, tudo cheio de frescura, onde tudo dói e todos choram por qualquer coisa…

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