sábado, 16 de março de 2024

O BARBEIRO DE IGREJA NOVA

 Texto de Aloisio Guimarães

Para quem não conhece o estado de Alagoas, Igreja Nova é uma cidade do interior alagoano, localizada entre a histórica cidade de Penedo, às margens do Rio São Francisco, o nosso "velho Chico", e a cidade de São Sebastião, antigo povoado Salomé, às margens do entroncamento Porto Real do Colégio/Penedo/Maceió/Arapiraca.
Como não poderia deixar de ser, Igreja Nova é uma cidade pequena, onde todo mundo conhece todo mundo e por isso mesmo a fofoca corre solta, principalmente em época eleitoral. Além disso, claro, Igreja Nova Como tem uma característica comum a toda cidadezinha do interior do Brasil: quem quiser saber "quem é quem" na cidade, é só ficar "marcando ponto" na barbearia local porque é lá que toda a verdade aparece. Assim, durante década de 70, a barbearia "A Tesoura de Ouro", de propriedade do Robertinho, foi a fonte de informação dos fofoqueiros de Igreja Nova. Quem quisesse saber da vida dos outros, era só dar uma chegadinha por lá e perguntar:
- E aí, Robertinho, quais são as novas?
Pronto! Era um prato cheio para o Robertinho rasgar o verbo, falando mal de todo mundo, metendo o pau em Deus e no diabo. Muita gente boa da cidade detestava o barbeiro, com um medo desgraçado da língua ferina do Robertinho.
Contam que, certo dia, em virtude das economias que fez durante os muitos anos que viveu cortando cabelo e barba, Robertinho, mesmo sendo uma "munheca de pau" (como é popularmente chamado quem não sabe dirigir direito), conseguiu comprar um fusquinha 63 que, de tão velho, já estava "queimando óleo" (quase batendo o motor).
Feliz com o seu carrinho, mas metido a besta, no primeiro final de semana, Robertinho chamou a sua esposa, a Maria José, mais conhecida com o Zefinha, e avisou:
- Mulé, ajunta as coisas aí, que vamu prá capitá.  Hoji, ocê vai cunhecê o má!
Imediatamente, Zefinha, toda ansiosa, pois nunca tinha visto o mar, atendeu às ordens do marido, mas sugeriu:
- Mô, a cumadi Quitera podi ir cum a gente? Ela é estudada e já conhece a capitá do estado e o má...
Robertinho, não gostou muito da ideia porque a sua comadre Quitéria, depois dele, era considerada a maior fofoqueira da cidade. Mas, mesmo reticente, ele atendeu ao apelo da esposa. Tão logo arrumaram as malas, se mandaram para Maceió...
Assim que o fusquinha do Robertinho chegou no Mirante do Gunga (famosa praia alagoana - cartão postal do estado), Zefinha, vendo aquela imensidão verde da maravilhosa cor do mar alagoano, disparou:
- Vixe, Betinhu, quantu capim, hômi!
Nesse momento, Robertinho, dando uma de profundo conhecedor do mundo, ensinou:
- Num é capim não, minha fia, é o má... Muitu cuidadu, prumode qui ele é sargado!
Ao ouvir a ignorância da comadre Zefinha, mulher do Robertinho, a Quitéria já estava "gozando por dentro", doida para voltar para Igreja Nova e espalhar a nova fofoca...
Minutos depois, já no viaduto que fica em frente ao antigo DETRAN, Robertinho, maravilhado com a visão da Praia do Sobral e da Praia da Avenida da Paz, se distraiu e deu um trancão em um carro que vinha ao seu lado:
- Barbeiro! - xingaram diversas vezes os ocupantes do outro carro.
Quanto mais o chamavam de "barbeiro" (um mau motorista), Robertinho ficava orgulhoso. Nisso, vira-se para a Quitéria e comenta:
- Tá venu, cumadi Quitéra? Eu tamém sô cunhicidu aqui na capitá...
- Tô vendo compadre, você é mesmo conhecido... - respondeu, com ironia, a Quitéria.
Mais adiante, quando chegaram no semáforo da Ponte do Riacho Salgadinho, Robertinho "furou" o sinal vermelho, quase provocando uma colisão. Zangado, o motorista do  outro carro, gritou:
- Corno!
Nesse momento, foi a vez da Zefinha, a mulher do Robertinho, com voz nervosa, perguntar:
- Betinhu, meu fio, né mió nois vortá logo pra casa?
Ao ouvir o que a Zefinha perguntou, Robertinho nada comentou, deu meia volta no carro e voltaram para Igreja Nova, tudo sob o riso matreiro da fofoqueira Quitéria, que logo entendeu o medo da sua comadre Zefinha.
E assim, desse dia em diante, o barbeiro Robertinho nunca mais falou mal de ninguém, principalmente da comadre Quitéria...

Nenhum comentário:

Postar um comentário