segunda-feira, 17 de agosto de 2020

PROFESSOR BENEDITO DE MORAIS


Texto de Luiz Ferreira da Silva

Artigo elaborado na expectativa
 de resgatar ex-alunos do Mestre,
com vistas a um pretenso encontro.

Em 1956, por orientação do colega do Liceu Alagoano, Djalma Bastos de Morais, seu sobrinho, matriculei-me na primeira turma de álgebra do Professor Benedito, como assim era mais conhecido
Não era para qualquer um. Além de famoso e exigente com o giz nas mãos, sua forte compleição física e voz aguda estridente, ademais das baforadas do seu cachimbo, externavam um campo energético contagiante, que ia da admiração ao receio absortivo.
Com certeza, era essa aura que mantinha a classe vidrada nos seus ensinamentos, eivados de trejeitos e certo humor, mantendo-a plenamente conectada, facilitando o entendimento de temas áridos.
Dessa forma, discorria sobre a teoria de aritmética, uma matéria desconhecida da turma, até chata, mas palatável à medida que o mestre a empurrava de goela a dentro, mostrando o quanto era importante ou interessante saber os “noves-fora um” ou que “zero dividido por zero era sete”.
Mais adiante, esmerava-se em nos explicar a correspondência dos lados do triângulo, identificando os ângulos congruentes, fazendo-nos ligados à semelhança desta forma geométrica, diretamente ou sobrepondo-os imaginariamente.
No mesmo diapasão, já na segunda turma, um outro tema não tão ao nosso gosto, as famosas séries convergentes, era esmiuçado a um nível de compreensão plena.
No decorrer das aulas, usava técnicas para amenizar a chatice dos números, ora com alguns “chistes” curtos, ora dando um freio de arrumação no pessoal, evitando dispersão ou perturbação da ordem.
Um aluno, ao lhe ser perguntado sobre determinado assunto, no decorrer de uma sua explanação, respondendo que sabia, mas se esquecera, prontamente, na bucha – “se esqueceu ou nunca soube”?
De outra feita, interrompido no meio de um teorema, voltava-se ao interlocutor inopinadamente – “aguarde um pouco, deixe-me concluir, que isto aqui está decorado”.
Ou, concentrado num problema com a poeira do giz lhe maquiando o rosto, notava alguém sem prestar a devida atenção, conversando com o parceiro ao lado, parando a aula: - “vamos esperar que o fulano acabe o papo, para eu poder continuar com a aula”. Isso deixava os dois no chão, literalmente.
Por outro lado, melhorei o meu deficiente latim do padre Pontes, como um efeito colateral positivo. No meio duma afirmativa matemática, lascava a expressão “mutatis mutandis”, que nos orientava a aplicá-la em outras situações, bastando mudar o que deveria ser mudado. E quem não se lembra do “a fortiori”?
O nosso acesso era restrito ao salão, logo à direita após subir os degraus da soleira daquela casa da Praça das Graças, limitando-se ao início do corredor, interceptado por sua cadeira e balanço, lugar preferido para o seu “fumacê” de fumo aromático.
Nunca presenciei ninguém lá de dentro, tampouco sua esposa. Possivelmente, ordens dele. Aliás, falava-se que se casara com uma tia. Com certeza, se é verdade, sob uma paixão avassaladora, transformada num amor de almas gêmeas.
Para se aquilatar o valor dos cursos do Professor Benedito, basta mensurar através dos subsequentes engenheiros, físicos, matemáticos, funcionários do Banco do Brasil e oficiais militares, de origem alagoana, espalhados por esse Brasil a fora, frutos do seu magnífico intelecto. (Maceió, AL, 24 de julho de 2.020).

2 comentários:

  1. Espero resgatar antigos colegas que frequentaram os bancos escolares do Mestre Biu, lá na Praça das Graças, na expectativa de promover um Encontro de saudades e reverência ao Professor Benedito de Morais. Para tanto, estou aproveitando este fecundo espaço gentilmente cedido pelo Dr. Aloísio Rodrigues.

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  2. Desculpe-me o colega escritor por ter errado seu sobrenome, GUIMARÃES. Provavelmente confundi com outro grande colega, do mesmo ramo, Amauri Rodrigues, com quem mantenho constantes contatos.

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