terça-feira, 28 de dezembro de 2021

CARTA AO PANETONE

Texto de Rosana Hermann 

Querido Panetone, 
Eu te amo, mas não podemos viver assim: eu cortando você em pedaços e você me engordando sem parar. Quando o amor deixa o casal infeliz, é hora de parar. Amor não é sofrimento. 
Apesar da sua massa macia e suave, tem aquelas frutinhas cristalizadas de toda relação. Acredite, vai ser melhor para nós dois. Você fica com sua integridade, e eu com minha cintura. Continuarei olhando você com ternura e desejo, mas sabendo que já não nos pertencemos mais. 
Adeus, Panetone, foi doce, foi bom, mas deixou marcas que agora a blusa comprida precisa encobrir...
Adeus.  
 
RESPOSTA DO PANETONE 
Cara Rosana,
Antes de mais nada, muito obrigado. Não é sempre que tenho a oportunidade de me manifestar em público.
Primeiramente quero dizer que o que engorda não é o que você ingere entre o Natal e o Ano Novo, mas tudo o que você come entre o Ano Novo e o Natal, portanto, já começo aqui minha defesa.
Sou um panetone fofo, honesto, digno e correto. Estou dentro do prazo de validade e, sobretudo, fui dado a você como presente. Portanto, não seja ingrata com quem me ofereceu a você. Além disso, sou nutritivo, saboroso e, como você não há de negar, gero muito prazer para quem sabe me apreciar. E se você não que queria desde o começo, deveria ter me doado para alguém que tem fome.
Sem querer ser grosseiro com meus amigos vegetais, você pisou na jaca.
Sei que você nutre grande admiração por mim e que sua intenção de me deixar está muito mais ligada à sua incapacidade de administrar seu peso do que a qualquer tipo de insatisfação comigo. Quanto a isso, não há nada que eu possa fazer. Sou apenas um panetone. Não posso atuar como seu personal trainer, nem seu nutricionista, massagista ou psicólogo.
Sinto muito pela sua decisão. Sei que ainda vamos nos encontrar em outra ocasião, porque conheço os seres humanos e sei que assim como minha massa é mole, a carne é fraca. Você ainda vai ter uma recaída. Não encare isso como uma praga, mas como uma constatação de uma criatura que entende muito das tentações do Natal.
De qualquer forma, quero agradecer os bons momentos que passamos juntos. Quero também, outrossim, defender as frutas cristalizadas, pequenos pedacinhos coloridos cheios de boas intenções que em nada ofendem o fino paladar do consumidor.
Acho que você está carente. Se eu tivesse bracinhos, daria um abraço em você. Por enquanto, Feliz Natal.
Do seu sempre,
Panetone

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