POSTAGEM: ALOISIO GUIMARÃES
Pelo que você já me disse com o seu sotaque de anjo, percebo que você me
considera uma criança grandona e desajeitada, e me acha, mesmo assim, seu
melhor companheiro de brinquedos.
Pena que tenhamos tão pouco tempo para brincar, tão pouco porque só sei
brincar de passado, e você só sabe brincar de futuro. E ainda estarei brincando
de recordação quando você começar a brincar de esperança.
Mas antes que termine o nosso recreio juntos, antes que eu me torne apenas
um retrato na parede, uma referência do meu genro, ou quem sabe até uma lágrima
de minha filha, quero lhe dizer meu neto, que vale a pena.
Vale a pena crescer e estudar. Vale a pena conhecer pessoas, ter
namoradas, sofrer ingratidões, chorar algumas decepções. E, a despeito de tudo
isso, ir renovando todos os dias a sua fé e a bondade essencial da criatura
humana, e o seu deslumbramento diante da vida.
Vale a pena verificar que não há trabalho que não traga sua recompensa;
que não há livro que não traga ensinamentos; que os amigos têm mais para dar
que os inimigos para tirar; que se formos bons observadores, aprenderemos tanto
com a obra do sábio quanto com a vida do ignorante.
Vale a pena casar e ter filhos. Filhos, que nos escravizaram com o seu
amor.
Vale a pena viver nesses assombrosos tempos modernos, em que milagres
acontecem ao virar de um botão; em que se pode telefonar da Terra para a Lua;
lançar sondas espaciais, máquinas pensantes à fronteira de outros mundos, e
descobrir na humildade que toda essa maravilha tecnológica não consegue,
entretanto, atrasar ou adiantar um segundo sequer a chegada da primavera.
Vale a pena, meu neto, mesmo quando você descobrir que tudo isso que estou
tentando ensinar é de pouca valia, porque a teoria não substitui a prática, e
cada um tem que aprender por si mesmo que o fogo queima, que o vinagre amarga,
que o espinho fere, e que o pessimismo não resolve rigorosamente nada.
Vale a pena, até mesmo, envelhecer como eu e ter um neto como você, que me
devolveu a infância.
Vale a pena, ainda que eu parta cedo e a sua lembrança de mim se torne
vaga. Mas, quando os outros disserem coisas boas de seus avós, quero que você
diga de mim, simplesmente isso: “Meu avô foi aquele que me disse que valia a
pena. E não é que ele tinha razão?!”
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