
- Até que entendo sua vontade, mas
esse negócio de trair, na maioria das vezes torna em arrependimento, piora a
depressão. Faça as coisas que o coração mandar, porém, tenha calma, reflita
para depois não se arrepender - aconselhou Gabriela.
- Você condena essa vontade de eu
trair, minha amiga?
- Quem sou eu para julgar? Para
condenar alguém. Como amiga posso dar uma opinião, apenas isso. Sei que é uma
situação passageira, por isso aconselho pensar, o travesseiro noturno ou uma
volta na orla contemplando o mar, refletindo, acalma o coração, faz bem a
depressão.
- Gabriela, o problema maior é o meu
desprezo pelo Zeferino, nunca pensei, ele é um cara fraco, perdedor, desde que foi
despedido do emprego há mais de sete meses, vive dentro de casa, esperando as
coisas caírem do céu. Todo dia é uma desculpa ou uma mentira de promessa de
emprego, culpando o governo. Eu sustento a casa, comida, água, luz, telefone, o
colégio do Carlinhos, tudo com o trabalho de cabeleireira no meu salão de
beleza. Não tenho descanso nem aos domingos para sustentar a casa. O Zeferino nem
aí, só sai para o botequim, chega na hora do jantar, o português da bodega já
não vende fiado. É uma tristeza. Minha única reação é não transar quando ele se
achega querendo coisas. Uma noite me pegou a pulso, não sei mais o que fazer.
Que ele merece um chifre, merece. Tenho um cliente, coroa alinhado, elegante,
faz cabelo e unhas toda semana, olha demais para mim, conversamos muito, eu
deixo meu decote bem aberto ele fica contemplando, mas é um homem sério. Da
última vez que ele foi ao salão, estava lendo numa revista uma reportagem sobre
o filme 50 Tons de Cinza, disse que viu o filme, gostou das cenas de sexo. Eu sorri
para ele perguntando se gostava da fruta. O coroa deu uma gargalhada, me
respondeu, gosto e é bom. Apesar de ele ter chegado aos sessenta anos, tenho
certeza, se eu quiser, sai comigo.
- Eugênia, veja o que vai fazer. A
melhor solução para briga ou desentendimento é o diálogo. Faça uma força, fale
francamente, com o Zeferino, diga tudo que pensa, que ele arranje um emprego,
nem que seja de varredor, não é desonra alguma.
Eugênia foi para casa, tirou o fim-de-semana para refletir.
Sábado, ao entardecer, foi contemplar o mar azul-esverdeado da praia de Jatiúca.
Pensou bastante nas palavras da amiga Gabriela, psicóloga. Consultou seu
coração e à mente, pensou no Zeferino, no Carlinhos e no sessentão cheiroso.
Era noite quando retornou à casa, primeiro, uma conversa franca com o marido.
- Que ares de felicidades são esses? - perguntou, dias depois, Gabriela
à Eugênia. Vejo que resolveu seus
problemas, gostei dessa transformação jovial, acabou-se a tristeza, a depressão,
voltou sua alegria.
- Minha amiga, tudo começou com o
contemplar do belo verde mar, me senti bem, pensei no que meu coração queria. A
primeira decisão foi ter uma conversa aberta com o Zeferino, disse que estava a
fim de me separar, fui franca, critiquei as grossuras dele comigo, a preguiça
de arranjar trabalho. Finalmente acertamos, outra chance no casamento, eu
ajudaria a procurar-lhe emprego. As coisas se arrumaram, estamos vivendo
melhor, ele agora tem um emprego arranjado por mim, ajuda no sustento da casa,
sua autoestima melhorou.
- Ainda bem que você apagou a ideia,
a vontade de trair com o coroa elegante - disse Gabriela sorrindo.
- É o que você pensa, o coroa
elegante chama-se Francisco, com ele arranjei um trabalho de almoxarife para o
Zeferino. O Doutor é engenheiro, tem uma construtora. Homem generoso e discreto.
Aqui para nós, satisfiz minha vontade. Apesar da idade, o coroa é ótimo, suas
invencionices na cama me deixam louca.
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