quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

PRIMEIRA EXIBIÇÃO

Texto de Luiz Antonio M de Albuquerque

Se até pouco tempo atrás um aparelho de televisão era grande, imagina antigamente! Era um verdadeiro elefante, gigantesco, pesado demais e ainda por cima funcionava à válvula, um dispositivo elétrico que necessitava de um bom tempo para esquentar e só depois aparecer a imagem. E, quando uma válvula dessas cismava de queimar, o que acontecia com frequência, era um Deus nos acuda! As eletrônicas não tinham peça de reposição e muitas vezes era preciso mandar buscá-la no Recife. Aí, meu filho, no mínimo, quinze dias sem televisão. O que nos restava nessas ocasiões era se valer da “televizinho”!
Sem mais demora, vamos ao causo:
No início da década de 70, minha mãe ganhou como presente do Dia das Mães uma televisão colorida, dado por uma das minhas irmãs, que nesse tempo trabalhava no IPASEAL, em Maceió.
Como televisão colorida ainda era “coisa de rico” e por isso muito mais cara aqui no nordeste, fui o encarregado de comprá-la em Vitória do Espírito Santo, onde morava na época, pois trabalhava na TV Gazeta de Vitória, capital daquele estado.
A companhia aérea Sadia, que depois se transformou em Transbrasil, foi a empresa utilizada para o envio da televisão, como carga, para Maceió. E tinha que ser Maceió porque o maior avião que até então já tinha pousado no “Campo de Aviação de Palmeira dos Índios”, pilotado pelo saudoso Geraldo Prata, era um daqueles monomotores, conhecidos como “Teco-teco”.
De Maceió para Palmeira dos Índios, a televisão seria transportada no trem de cargas, despachada diretamente para meu pai, Chefe da Estação Ferroviária.
Todo o sacrifício valia a pena porque, além de ser o presente da mamãe, a televisão que ela ia ganhar não era uma televisão qualquer: era uma Colorado RQ, a melhor marca da época e uma das melhores já produzidas no país até hoje! E ainda por cima colorida!
Vale lembrar que televisão colorida era uma raridade e privilégio de alguns ricos! Aos pobres, restava o "procedimento ridículo" de colocar papel transparente, com três faixas coloridas (azul, vermelho e amarelo), na frente do tubo de imagem!  Parece mentira, mas muita gente boa fez isso...
Para piorar o que já era difícil, ainda não existia nenhuma emissora de TV em Alagoas. O sinal "que pegava" era o da TV Rádio Clube de Pernambuco, por meio de uma antena colocada em um cano de ferro, o mais alto possível, porque, quanto maior fosse o cano, “melhor” seria a imagem, se é que podemos chamar  “chuviscos” de imagens!
Diante destas dificuldades iniciais, todas as providências para o grande momento foram meticulosamente estudadas e tomadas:
• Um “carro de praça” (como eram chamados os taxis antigamente) foi alugado para ir apanhar a televisão na estação, assim que o trem chegasse;
• A contratação de Zezinho, o melhor “antenista” de Palmeira dos Índios, para instalação do equipamento;
• E, como não podiam faltar, os convidados especiais, nossos amigos da Rua Graciliano Ramos, colegas de adolescência: Tânia, filha de Dr. Osvaldo; Vanderlino, filho do seu Manoel da Rodoviária; Vera, filha de seu Luiz Medeiros; Marcelo Barros, filho de seu Luiz de Barros do Cartório; Jarbas, parente de seu Sebastião Florêncio e o casal Vânia e José Arnaldo, filhos do nosso vizinho José Herculano.
E é chegado o grande dia...
Por volta das nove da noite, o carro de praça, trazendo o presente, estaciona porta lá de casa... Imagine a festa e a pressa para retirar o “trambolho” do carro e depois a ânsia em retirar a televisão da caixa!
Estávamos no céu! Desse momento em diante, o divertimento da família estava garantido: assistir televisão colorida (na verdade, “chuviscos coloridos”), com muita pipoca, feitas numa caçarola e com óleo comum. Micro-ondas e saco de pipocas de supermercados eram coisas ninguém imaginava que um dia pudessem existir!
Começa a instalação da televisão... Excitação total!
Nessa hora, Zezinho, o antenista, nos seus 15 minutos de fama, todo faceiro e cheio de mistérios, demorava maios do que podia para instalar a TV, querendo mostrar um alto grau de dificuldades e valorizar suas habilidades profissionais.
Após uns 40 minutos de grande ansiedade e expectativa, a instalação ficou pronta e a ordem de D. Maria Luiza (nossa mãe) foi dada:
- Atenção pessoal, todo mundo sentado e muito silêncio, porque televisão já vai funcionar!
Ligada na tomada e aquecendo suas válvulas, aos poucos o brilho da imagem começou a tomar conta da sala, sob os aplausos de todos, como se estivessem assistindo a mais uma vitória do Zorro sobre o Sargento Garcia, nos velhos seriados do Cine Palácio, de Itamar Malta.
Como ainda estávamos na chamada ditadura militares, a primeira imagem captada pela televisão da mamãe, foi um Slide da Censura Federal, obrigatório na época, liberando a exibição do filme, seguida da voz do locutor Rossini Moura:
- ESTE FILME FOI PRODUZIDO ORIGINARIAMENTE EM PRETO E BRANCO!
E assim, teve início uma sessão que não foi colorida, mas de boas gargalhadas...

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