sábado, 4 de julho de 2015

OS DOCES DA NOSSA INFÂNCIA

Texto de Carlito LimaA
 AO PETRÚCIO CODÁ

Uma das melhores coisas da vida é comer, seja qual o sentido. A arte culinária é peculiar, tem suas características. Nessa cidade de Nossa Senhora dos Prazeres, Maceió, comidas estão entre os melhores prazeres. Comer faz parte de nosso lazer, de nossa cultura. Lembrando o Bispo Don Pero Fernandes Sardinha, devorado, em apreciado banquete antropofágico nas areias brancas da praia de Barra de São Miguel por nossos ancestrais, os índios caetés.
Nossa juventude foi marcada por pratos e doces inesquecíveis. Ainda tenho em minha mente, em meu paladar, alguns feitos em casa por minha mãe, excelente cozinheira, caprichava nos almoços dominicais, caruru, galinha à cabidela, arabaiana ao olho de camarão ou feijoada de feijão mulatinho incrementada com charque, toucinho, tripa de porco, linguiça, carne do sol, couve, jerimum, quiabo, maxixe.
Havia pratos, hoje preparados em óleo vegetal, na época cozidos com banha de porco, o sarapatel, o fígado e o bife de panela. Sem esquecer do cozido, das macarronadas e peixadas de todo tipo.
Quando íamos ao centro da cidade invariavelmente lanchávamos em sorveterias da moda, Bar e Sorveteria Elegante em frente ao Beco do Moeda, frequentado pela classe média. Mesas de ferro com tampo de mármore, sorvetes de frutas regionais e pudins servidos em taças de metal niquelado.
Depois do sorvete, o chocolate caseiro em barras, duas cores, vendido pelo Seu Portela na loja especializada em óculos, vendia mais chocolate que óculos. Às vezes o sorvete de chocolate crocante na Sorveteria Xangai de Seu Fon, Rua da Alegria.
Ainda sinto o gosto e o cheiro das doces de nossa infância, ficaram para sempre entranhados nas narinas e glândulas palatares.
Acrescento à lista, os ambulantes que passavam na praia da Avenida da Paz. Depois do almoço ficávamos à espera de Seu Primitivo empurrando o carrinho de sorvete. Sempre dois sabores, coco e maracujá, coco e mangaba, coco e cajá, coco e goiaba, ele raspava o sorvete com uma colher enchendo o carlito (casquinha). Era nossa predileta sobremesa.
Ao entardecer, o China aboletava o tabuleiro de quebra-queixo embaixo de alguma amendoeira na Avenida, nós, tostões contados, encantávamos com a rapidez do corte vertical, um pouco inclinado, em pedaço de papel colorido ele entregava o quebra-queixo, cocada dura queimada com amendoim.
A moçada se deliciava com o algodão doce, rodado na hora numa panela com fogo, esquentava o açúcar fazendo enorme nuvem de algodão. Complementava tomando um raspadinho, gelo raspado dentro de um copo cheio de garapa de coco, maçã ou misto, uma delícia. E o caldo de cana, caiana!
Defronte ao coreto havia um futebol organizado. Depois do banho-de-mar, os jovens iniciavam papos e paqueras sentados na areia. Invariavelmente aparecia o Gaguinho empurrando o carrinho de sorvete XAXADO, uma delícia feita de frutas nordestinas. Gaguinho parava na roda oferecendo seu delicioso sorvete e picolé:
 - Quem vão quererem? Quem vão quererem? Podem pedirem!
Ele vendia fiado, na hora do almoço passava na casa de cada um com a conta do sorvete consumido.
As tardes na Rua do Comércio eram imperdíveis, jovens encostados nos automóveis (limpando carro) curtiam as meninas, flertando, marcando encontro nas Sorveterias DK-1 e Gut-Gut, saborosos sorvetes de frutas de todas as qualidades, ponto de encontro da moçada bonita.
Quando o Comércio fechava, eu descia rumo à minha casa, parada obrigatória na esquina do trilho de ferro, ao lado do Arcebispado, saboreava um suco maracujá com pão doce. Nunca ninguém no mundo até hoje conseguiu fazer um suco igual àquele, o sumo da divindade. Os deuses da gula em vez de água devem beber aquele maracujá.
É preciso um estudo mais profundo sobre comidas, salgados e doces dos anos dourados; fazem parte de nossa história.
A modernidade acabou com os doces de nossa infância, prolifera no mundo as lanchonetes dos Shoppings, sanduíches com gosto de sola de sapato, sofisticadas fábricas de obesidade inventadas pelos americanos.

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