
Ao entrar no avião ela tomou uma
poltrona na frente, no meio, enquanto Léo ficou na traseira. Ao decolar,
Leopoldo notou, a poltrona ao lado de Silvinha estava vaga. Certo momento ele
se achegou com um livro na mão.
- Ôi! Posso
sentar-me?
- Quanta
honra para mim - Disse a amiga sorrindo.
- Menina,
você está linda. Difícil uma mulher ficar assim em sua idade.
- Querido
Léo, sempre gentil. Conservar o corpo e a cabeça é uma obrigação de nossa
geração. Exige sacrifício, dieta, caminhada, yoga. A plástica ajuda. Você
também parece estar em forma para um boêmio que sempre foi e é ainda. Acompanho
sua vida ao longe.
- Estou no
terceiro casamento, sempre procurando pelo amor, sou um romântico. E você
continua casada com aquele médico carioca?
Tem netos? Eu tenho dois.
- Tenho
três netos. O médico carioca me deixou por uma jovem. Que livro é esse?
- “O Amor no
Tempo do Cólera”. Já leu?
- Ótimo
livro! Achei lindo o cara esperar 50 anos por seu amor, até que um dia
conseguiu. Diferente de você, meu amigo. Teve muitos amores na vida. Ainda
continua mulherengo?
- Silvinha,
na verdade, nunca lhe esqueci. Nós namoramos dois anos, lembra? Éramos
apaixonados. Um namoro bonito, eu não conseguia olhar para outra moça, só havia
você. O tempo e a distância foram cruéis, nos afastaram. Eu parti para estudar
agronomia em Minas. No primeiro ano nós suportamos a distância com belas cartas
e as gostosas férias. Depois seu pai foi trabalhar no Amazonas. Aí danou-se, a
distância fez você me esquecer e namorar o carioca.
- De fato.
Eu chorava como uma adolescente apaixonada, não queria ir para Manaus, mas fui
obrigada. Era uma menina de 17 anos, naquela época não tinha força. Jurei nunca
mais me apaixonar para não sofrer. Só pensava em você, coisa de adolescente.
- Passei
umas férias frustradas em Maceió. No carnaval caia na folia para lhe esquecer.
Talvez minha fama de mulherengo, namorador tenha sido a frustração de ter lhe
perdido. Quando você foi para o Amazonas a tristeza bateu em minha porta. Quer
saber? No fundo ainda resta alguma coisa daquele amor juvenil num cantinho do
peito.
- Ai que
lindo! Assim não vale. Não mexa com meus sentimentos. Hoje você está com o cão
atazanando. Fique quieto menino. Você é um homem casado.
- Menina,
sempre fui louco e tarado por você. Vou lhe confessar: Quando você tinha 14 anos
já era moça feita e ia lá para casa brincar com minhas irmãs, ainda não
namorávamos. Eu inventava de brincar de professor, deixava cair o lápis e
ficava olhando por baixo da mesa suas maravilhosas pernas, você sempre de
calcinha branca.
- Meu
Deus!!! Lembro que começamos a namorar nos meus 15 anos. Naquele tempo namorado
não transava, mas você era adiantado nos agarrados e quando entrávamos no mar da
praia da Avenida eu ficava louca. Nosso namoro era considerado escandaloso para
época. Menino sem juízo!
- Você era
minha paixão. Quantas vezes eu me possui em sua intenção!
- Eu também,
em muitas noites insones pensava em seus carinhos.
- Quando
você voltou do Amazonas noiva de um médico do Rio de janeiro, deu-me uma
tremenda dor de corno, com todo o ciúme do mundo. Nesse dia fui à zona de
Jaraguá e tomei o maior porre.
- Engraçado,
no dia de meu casamento eu estava feliz, confesso, mas fiquei lhe procurando
entre os convidados, você não foi. E todas as viagens que fiz a Maceió eu tinha
vontade de lhe ver. Pouco nos vimos. Passei minha vida no Rio, gosto de lá,
meus filhos também. Criei raízes. Embora eu tenha me machucado com o ex-marido,
continuo naquela vida. Venho a Maceió para passear e rever amigos.
- Que tal
me rever?
- Ei! Estamos chegando, olhe que mar lindo de minha
terra!
- Não fuja
da conversa. Quero lhe ver amanhã. Vamos almoçar juntos?
- Almoçar?
Toda Maceió vai saber! Você está louco?
- Num local
discreto. Conheço uma suíte linda em Jacarecica.
- Você
sempre objetivo. Menino impossível. Que tal me pegar às três da tarde defronte
o coreto da Avenida. Está bom?
- Está
ótimo!
O avião aterrissou, Leopoldo
segurou a mão de Silvinha e cochichou em seu ouvido:
- Vá de
calcinha branca, por favor. São mais de 40 anos de espera!
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