sexta-feira, 17 de julho de 2015

COLÉGIO ESTADUAL HUMBERTO MENDES

Texto de Aloisio Guimarães

Ao ler a maravilhosa obra "Tributo à Antiga Escola Pública" do mestre Luiz Ferreira da Silva, começaram a aflorar as lembranças da minha turma do Curso Científico do Colégio Estadual Humberto Mendes, em Palmeira dos Índios, que, na época dos anos setenta, era um dos melhores colégios públicos de Alagoas, ao lado do Colégio Estadual Moreira e Silva, em Maceió. Hoje, lamentavelmente, tal qual milhares de escolas públicas, o "nosso estadual" é uma vergonha.
Não é difícil imaginar o cenário daqueles dias da década dos anos 70: uma turma de estudantes pobres (mas dedicados) de uma escola pública do interior de Alagoas, morrendo de estudar, dia e noite, porque sabiam que o que ali estavam aprendendo era a "tábua de salvação" para mudar de vida. Era uma época em que a escola pública reprovava e os reprovados eram castigados pelos seus pais e ninguém nunca ficou traumatizado ou precisou de psicólogos por causa disto. Infelizmente os tempos mudaram e coitado daquele professor que ousar reprovar um aluno. 
Sabíamos disso tudo e ralávamos para tentar passar no vestibular, caso contrário, o nosso destino seria trabalhar no comércio (com todo o respeito aos comerciários), pois era o que tínhamos na cidade como oportunidade de trabalho. Para alcançar os nossos objetivos, explorávamos, à exaustão, os nossos excelentes professores. E que seriam estes professores tão competentes, que ensinavam em uma escola púbica do interior de Alagoas? Respondo, com alguns exemplos, salientando que os demais professores também estavam no mesmo nível:
● Francisco Vieira Barros: O popular "Chico Potiguar", professor de Matemática, de conhecimento profundo e dono de uma didática singular. Tinha o dom de, na segunda aula, já saber o nome de todos os alunos da turma. Anos depois, fomos colegas de sala de aula, nas memoráveis aulas do Prof. Edmilson Pontes, quando fizemos juntos o curso de Matemática na UFAL. Depois que se mudou para Maceió, "Chico Potiguar" se notabilizou em toda Alagoas, ganhando a admiração dos alunos da área de exatas, tanto ensinando Matemática na UFAL como professor em cursinho pré-vestibular. Ainda hoje, "Chico Potiguar" ainda continua na labuta.
● Sinvaldo Gama: Que conhecimento de Matemática tinha (e tem) o cara! Foi com ele que aprendemos a difícil "Análise Combinatória". Nas suas aulas de Trigonometria, ele desenhava um círculo tão perfeito, à mão livre, que, muitas vezes, quando ele saía da sala, a gente usava o compasso para testar a admirável eficiência da sua mão. Do nosso colégio, Sinvaldo passou a ensinar Cálculo na Universidade Federal de Alagoas, gozando também de excelente conceito.
● Wellington Coimbra Lou: Professor de Química, dono de uma caligrafia e didática impecáveis. Ensinava química como ninguém, principalmente Química Orgânica. Tempos depois, ele passou a ensinar na Universidade Federal de Alagoas, com o mesmo conceito que tinha no nosso "velho" estadual.
● Roberaldo Carvalho de Souza: Professor de Física. Pense num baixinho invocado, professor "carrasco", temido pelo rigor das suas provas. Tal qual os citados anteriormente, após fazer doutorado nos EUA, se tornou professor da Universidade Federal de Alagoas.
● José Delfim da Mota Branco: Professor de História, "Zé Branco", como era mais conhecido, era um professor rigoroso. As suas provas eram quase todas orais, quando ficávamos de pé, na frente da turma, respondendo as perguntas que ele fazia. Tão rigoroso que reprovou até Salu, o seu próprio filho. Terminou a vida como um conceituado advogado na cidade.
● Vanda Ramos: Professora de Geografia. Conhecida como "Vandinha", apesar dos seus quase dois metros de altura. Competente, veio para Maceió, onde terminou professora de Geografia na UFAL.
Esses exemplos demonstram claramente o que era o ensino público de antigamente. Tempo em que quem estudava em escola particular era taxado de "não querer nada na vida e de quem não queria estudar". Era o tempo em que escola particular era taxada de "Pagou, passou".
E que eram os meus colegas de classe da época? Lembro-me de todos e, em alguns casos, até do nome completo. É evidente que vou citar alguns, tanto pela amizade como pela inteligência. Vamos a eles:
● José Einstein Lisboa Martins Torres: Uma das pessoas mais inteligentes que conheci na vida. Apesar de uma boa amizade, à época, era o meu rival da turma. Competíamos silenciosamente para tirar notas melhores do que o outro. O interessante era que nunca declaramos guerra aberta e este fato nunca interferiu na nossa amizade. Inclusive, sempre estudávamos juntos, na casa dele, na Praça de São Pedro. O seu pai, José Torres, foi, talvez, o Promotor de Justiça mais conceituado que passou por Palmeira dos Índios. O que eu achava interessante é que, mesmo sendo um "cobrão", Einstein não dispensava a imagem de uma santa, em cima da carteira, na hora da prova. Desde 1973 que não o vejo, visto que ele passou no vestibular de Engenharia Elétrica no Recife e perdemos contatos. Vai não vai, encontro-me com o seu irmão Herbert Torres, conceituado psicólogo, ator e cineasta de nosso estado.
● Josias Barros: Um "fera" em todas as disciplinas. Por ser de origem pobre (trabalhava numa oficina mecânica), gozava de alto conceito junto aos professores e era o ídolo do grupo dos alunos menos favorecidos economicamente. Por ser pobre, ele teve que optar entre fazer o vestibular ou o concurso do Banco do Brasil. É claro que optou pelo concorrido concurso do banco, uma vez que, à época, os funcionários do Banco do Brasil e da Caixa Econômica ganhavam muito bem; eram considerados elite. Josias foi provado nos primeiros lugares. Lamentavelmente, morreu de acidente, meses depois de assumir o cargo e comprar o carro que causou a sua morte prematura.
● Pedro Rafael Sampaio: Baixinho, invocado, caladão, mas um excelente aluno. Estava sempre na turma das melhores notas. Apesar de um relacionamento cordial, os nossos santos não se davam muito bem, visto que eu sempre ironizava a sua paixão por Biologia, principalmente o fato dele gostar de caçar e colecionar borboletas e besouros, vestido à caráter, tal qual víamos nos filmes. A sua paixão pela Biologia o levou a ser aprovado em Medicina, chegando a assumir destacado cargo na Secretaria da Saúde do nosso estado.
● Eanes Rodrigues dos Santos: Minha grande amizade na turma. Bastante inteligente, mas com um grave defeito: era extremamente nervoso. Filho de um carteiro dos correios, Eanes também teve que optar entre o vestibular e o concurso da CEF. Optou pela CEF, onde atuou como Gerente. Faleceu há poucos anos, vítima de doença degenerativa.
● José Hugo Cardoso Ferro: Outro gênio. "Zé Hugo" foi o aluno da nossa turma que ganhou mais espaço na mídia. Além de se formar em engenharia civil, foi aprovado na CEF, onde, por muitos anos, foi Superintendente Geral no nosso estado.
● José Joaquim Ferro Costa: Baixinho, gordinho, inteligente e brincalhão, o "Quincas", foi aprovado em Física e hoje é o mais conceituado especialista em Medicina Nuclear em Alagoas - isso diz tudo.
● Lúcio Wanderley: Irmão do cardiologista José Wanderley, Lúcio seguiu os passos do irmão: é médico.
● José Reginaldo de Araújo: Chegou para estudar vindo de Rainha Izabel, Pernambuco. Meio matutão, desengonçado, tanto que recebeu o apelido de "Trupi Zupi". Muito inteligente, se formou em Engenharia Civil. Hoje, exercendo as suas atividades na Prefeitura de Maceió.
● José Lobo Filho: De tradicional família palmeirense, “Zuza”, como o chamávamos, se formou em Odontologia, se tornando um conceituado profissional do ramo.
● Maria Alves: Baixinha, carinha de japonesinha, bonitinha, era a musa da turma. Caladona, “comia pelas beiradas”, ou seja, tirava notas excelentes, sem grandes alardes. Formou-se em Odontologia.
● Maria Vitória: Amiga inseparável de Maria Alves, do tipo carne e unha. Na hora da chamada, "Chico Potiguar" a chamava de "Maria de las Vitórias". Depois dos estudos, se mudou para a Paraíba.
● Francisco "Chico Filão": Por incrível que pareça, não lembro o sobrenome do cara. Se fosse hoje, seríamos acusados de bullyng por causa deste apelido que colocamos nele. A coisa pegou tanto que ele ficou conhecido em toda a cidade por esse “nome”. O motivo do apelido foi simples: como o Chico era de poucas amizades e tirava sempre boas notas, nós, invejosos, passamos a espalhar que ele vivia "filando" (colando) nas provas. Foi um passo para a coisa pegar. "Chico Filão" também foi aprovado no concorrido concurso do Banco do Brasil.
● João Bosco Torres: Um bom aluno em todas as disciplinas, mas era o "cobrão" da turma, em Português, porque tinha uma boa base em Latim. Bosco foi mais um que optou pelos concursos e foi aprovado no Banco do Brasil.
● José Francisco: Ganhou logo o apelido de "Chico Batalha", cidade de onde veio para estudar Palmeira dos Índios. É Agrônomo.
● José Agostinho dos Santos: Um sujeito bonachão, prestativo ao extremo. Foi aprovado em Física, se tornando professor da disciplina, na rede estadual.
● José Teodorico de Araújo Filho: Aqui, uma inclusão à parte. Amigo de infância, pois morávamos na mesma rua, Teodorico se formou em Agronomia, se tornou professor da UFAL e foi Secretário da Agricultura do Estado de Alagoas.
A todos eles, um abraço, a minha saudade e a tristeza em saber que o ensino público, hoje em dia, é uma vergonha nacional.

2 comentários:

  1. Caro amigo Aloisio, fiquei muito feliz e lisonjeado com sua opinião a meu respeito. Você disse bem, tínhamos disputa totalmente sadia e éramos muito ligados, estudando juntos. Você também ficou em minha lembrança como inteligência pura. Há anos sou leitor assíduo de seu excelente blog e já nos comunicamos virtualmente pelo mesmo.

    Que tal organizarmos um encontro, em Maceió, da turma do Humberto Mendes e Moreira e Silva ?

    Abraços,

    Einstein Torres.

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    1. Einstein,

      Um prazer ler notícias suas e saber que, mesmo virtualmente, nos comunicamos.

      Quanto ao encontro proposto, vai depender de quem possamos entrar em contato. Vamos tentar...

      Abraço.

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