Texto de Carlito
Lima
Não houve planejamento de roteiro, parávamos
onde bem entendíamos, dormíamos no primeiro hotel ao anoitecer, quando alguém cansava
na direção, outro assumia, assim nós quatro amigos viajamos de carro, passar
férias de verão no Rio de Janeiro, corria a maravilhosa década de 1970.
No interior da Bahia pernoitamos no
Hotel Familiar. Os preços das diárias fixados em um quadro negro: “QUARTO COM PINICO: CR$ 5,00”. “QUARTO SEM PINICO:C$ 4,00”. A foto
dessa pérola brasileira foi perdida.
Chegamos ao Rio cansados, direto ao
apartamento do Cáo, Rua São Salvador, Flamengo, a Embaixada de Alagoas. Sempre
havia um colchão.
Naquela época funcionava a Casa das
Alagoas, associação assistencial aos alagoanos radicados no Rio de Janeiro. Ponto
de encontro, matar saudades, unir a tribo caeté. Roberto, presidente da
associação, havia ganho uma eleição disputadíssima contra Ronaldo, programou um
roteiro de festas para aquele fim de semana.
No sábado estava marcado um
pré-carnavalesco, "Baile Vermelho e Preto” no Clube de Regatas Flamengo. Embaixo
do edifício fervilhava botecos, bares, ponto de encontro da esquerda festiva,
cheios. As meninas iam se achegando, começavam as paqueras. Todos vestidos com
camisas rubro - negras, inclusive tricolores, vascaínos, botafoguenses.
Partimos para a sede do Flamengo.
Roberto, organizado, comprou os
ingressos antecipadamente. Na hora da entrada faltou ingresso para Sandoval,
carioca, morou em Alagoas, sentia-se alagoano. O Clube cheio, não havia mais
ingressos à venda.
Ficamos matutando como resolver o
problema da entrada de Sandoval, procuramos cambista ou quem quisesse vender um
ingresso, nada. O tempo passando, nós, agoniados, perdendo o baile cheio de
mulheres bonitas.
De repente Roberto observou um caminhão
fazendo manobras, tentando entrar pelo portão lateral, gritou:
- Encontrei a solução!
Venha cá Sandoval!
Partiram
em direção ao caminhão. Confabularam com o motorista. Roberto voltou alegre,
tudo resolvido: Soltaram uma grana, colocaram nosso amigo por trás do caminhão frigorífico
que levava gelo à festa.
Entramos satisfeitos, acompanhados por lindas
cariocas. A orquestra tocava o hino do Rio de Janeiro: “Cidade Maravilhosa... Cheia de encantos mil... Cidade Maravilhosa... Coração
do meu Brasil ...”
O baile fervia animado. Depois de
algumas voltas encontramos Sandoval no bar tomando conhaque, molhado, batia o
queixo. Vinte minutos dentro do frigorífico do caminhão; quase morre congelado.
Empurramos o carioca para o salão, sambamos até o dia amanhecer com charmosas
rubro-negras.
No domingo pela manhã, marcamos encontro na Praça General Osório.
Maior expectativa, desfilar na Banda de Ipanema. Roberto havia providenciado
uma ala para os alagoanos. Nossa fantasia, sunga de banho de mar, tamanquinho
de praia e uma toalha em volta do pescoço para abastecer de lança-perfume.
Começamos a esquentar as baterias num
bar perto da praça. Uma festa reencontrar velhos amigos. O bar lotado, nossa
mesa das mais concorridas, meninas bonitas, namoradas, paqueras. Era só
alegria, felicidade e carnaval.
Em certo momento Sandoval sentiu fortes
cólicas, talvez consequência da friagem do frigorífico, foi se esvair no
acanhado e sujo banheiro. Depois dos serviços, depois de ter obrado, voltou à
mesa. Pagamos a conta, levantamos, na partida, pela primeira vez alguém
reclamou:
- Eita fedor de merda!
Alguém pisou em bosta!
Olharam no solado dos tamancos, nenhum vestígio de cocô. Nessa altura
havia uma multidão na Praça General Osório. A Banda animada tocava o samba: “Nesse carnaval
não quero mais saber... de brigar com você... vamos brincar juntinhos... água
na boca para quem ficar sozinho... as nossas brigas... não podem continuar...
porquê nosso amor não pode se acabar...”
Nosso grupo animado, ala cheia de
mulheres bonitas, contrastava com o cheiro de merda no ar. Até que a fonte
fedorenta foi descoberta, Sandoval. Na hora do serviço, parte do tolete lançado
no sanitário caiu na sunga. Ele, sem sentir, vestiu-a novamente. Infestou-se de
cocô.
A Banda de Ipanema acabou-se à noite.
Programamos terminar a farra no Alkazar, Copacabana. Enfrentamos um ônibus
lotado, muita gente em pé, se acotovelando. A certa altura um passageiro
gritou:
- Motorista pare! Alguém cagou dentro do
ônibus!!!
Resumindo a história, Sandoval preso, fomos
à Delegacia, solidariedade ao cagão. O delegado soltou Sandoval depois de tomar
um banho com sabugo.
Terminamos a noitada às gargalhadas no
Alkazar, relembrando as façanhas, namorando as belas cariocas até o fim das Férias
no Rio de Janeiro.
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