Eu tive que aceitar que eu viera ao mundo para fazer algo
por ele, para tentar dar-lhe o melhor de mim, deixar rastros positivos de minha
passagem e, em dado momento, partir...
Eu tive que aceitar que meus pais não durariam para sempre
e que meus filhos, pouco a pouco, escolheriam seus caminhos e prosseguiriam sua
caminhada sem mim. Eu tive que aceitar que eles não eram meus, como supunha, e
que a liberdade de ir e vir é um direito deles também.
Eu tive que aceitar que todos os meus bens foram me
confiados por empréstimo, que não me pertenciam e que eram tão fugazes quanto
fugaz era a minha própria existência na Terra. Eu tive que aceitar que os bens
ficariam para uso de outras pessoas, quando eu já não estiver por aqui.
Eu tive que aceitar que varrer minha calçada todos os dias
não me dava nenhuma garantia de que ela era propriedade minha e que varrê-la
com tanta constância era apenas um fútil alimento de que eu dava à minha ilusão
de posse.
Eu tive que aceitar que o que eu chamava de “minha casa” era só um teto temporário
que, dia a mais dia menos, seria o abrigo terreno de outra família.
Eu tive que aceitar que o meu apego às coisas só apressaria
ainda mais a minha despedida e a minha partida.
Eu tive que aceitar que meus animais de estimação, a árvore
que eu plantei, minhas flores e minhas aves eram mortais. Eles não me
pertenciam! Foi difícil, mas eu tive que aceitar.
Eu tive que aceitar as minhas fragilidades, os meus
limites, a minha condição de ser mortal, de ser atingível, de ser perecível. Eu
tive que aceitar para não perecer!
Eu tive que aceitar que a vida sempre continuaria, com ou
sem mim, e que o mundo em pouco tempo me esqueceria. Eu me rendi e aceitei que
eu tinha que aceitar. Aceitei para deixar de sofrer, para lançar fora o meu
orgulho, a minha prepotência e para voltar à simplicidade da Natureza, que
trata a todos da mesma maneira, sem favoritismo.
Humildemente eu ti confesso que foi preciso eu fazer cessar
umas guerras dentro de mim. Eu tive que me desarmar e abrir meus braços para
receber e aceitar a minha tão sonhada paz!
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