Texto
de Carlito Lima
Arnaldo quando criança vivia brincando de médico com as primas. Era
o doutor. Certa vez, Tio Alberto pegou-o fazendo massagem na bundinha da
priminha. Ficou de castigo, proibido de brincar e falar com as primas.
Sentiu-se injustiçado. Na puberdade vivia à cata de empregadas doméstica. Elas
gostavam de serem assediadas pelo frangote. Arnaldo perdeu a virgindade aos 13
anos na cama dos pais. Eles viajaram, deixaram-no sozinho com Jacinta, negra
gorda, bonita e libertina. Arnaldo pediu, implorou, amor durante todo o dia.
Jacinta não resistiu, menino insistente. Ele foi à Glória, não era mais virgem,
se gabava.
Na adolescência, conviveu com as primas, festas, clubes. Namorou
todas as primas possíveis. Afirmava “priminha não é irmãzinha”.
Quis o destino, casou-se com uma prima, bela sertaneja criada com
leite de jumento, disposta e ciumenta. Ela adorava o bigodinho à lá Clark Gable
do marido, ares de galã do cinema.
Nosso herói tinha medo da destemida esposa, fazia estripulias bem
escondidas. Arnaldo nunca foi de deixar as coisas acontecerem, quando podia, a
imaginação funcionava, inventava viagens e reuniões para ter nos braços alguma
quenga, não interessava, fosse mulher, bastava.
No início do ano, Arnaldo conheceu uma morena, bonita, vistosa,
quarentona, todas as carnes no lugar, durante uma festa na casa de um amigo.
Ela em férias, do Recife, muito divertida. Durante a conversa, Rosa deu
opiniões avançadas, achava casamento enfadonho, havia passado por dois.
Afirmou, na vida para valer todos somos solteiros, ninguém é de ninguém, deu
uma discreta piscada de olhos para Arnaldo. Ele estremeceu na cadeira.
Na saída Arnaldo distribuiu alguns cartões de visita, o objetivo
era Rosa, ao receber deu um sorriso malicioso. Ele conseguiu cochichar:
“telefone-me”.
Em casa, Gal comentou, Rosa tinha cara de piranha, se oferecendo
aos homens. Ainda bem que havia respeitado sua presença, não deu em cima de seu
marido, se acontecesse ela abria no pau. Ele só dizia: "Que nada meu
amor!".
Na segunda-feira Arnaldo trabalhava no escritório, o celular tocou,
era Rosa, ele quase explode de alegria. Conversaram algum tempo, marcaram, três
da tarde, defronte ao Memorial Teotônio Vilela, praia da Pajuçara.
Não atrasou, de longe enxergou a morena, vestido vermelho. Parou o
carro, ela entrou, seguiram para o motel. Arnaldo estava pleno de alegria. Ele
não se apaixona, simplesmente tem prazer em estar com mulher, de flertar, de
amar, a coisa mais sublime na vida. Uma aventura com uma bela mulher, era o
êxtase.
Rosa, extremamente divertida, passou alguns dias na cidade, saindo,
quando podia com nosso Arnaldo. Convidou-o a passar o carnaval no Recife,
aliás, em Olinda onde morava. Ele iria conhecer o melhor carnaval do mundo.
Afinal ela retornou, o trabalho chamou-a, deixou Arnaldo matutando
como fugir para o Recife no carnaval. No
domingo ele leu no jornal, haveria um retiro espiritual para evangélicos no
litoral norte, durante o carnaval.
Arnaldo imediatamente começou a frequentara Igreja, confessou à
mulher, uma voz forte o chamara. Gal ficou impressionada, temente a Deus, deu
incentivo que o marido fosse à igreja evangélica. Ao chegar em casa, abria a
bíblia, orava, dizia para si mesmo: “Olinda vale uma reza”.
Nas vésperas do carnaval informou à esposa: Faria um retiro
espiritual, só homens, no litoral norte durante os quatro dias, de sábado à
quarta-feira. Gal ficou encantada com a transformação do marido, concordou. Ela
aproveitaria para visitar a família na fazenda perto de Cacimbinhas durante o
carnaval. Os dois filhos, já homens, se viravam.
Arnaldo se inscreveu para o retiro, com seu nome na relação, pagou
os dias de hospedagem no hotel do litoral norte.
No sábado de carnaval, quando Gal partiu no carro da irmã para
Cacimbinhas, avisou, por recomendação da direção do retiro, o celular ficaria
desligado, deu um número para emergência. Arnaldo partiu para o retiro.
Conheceu companheiros, orou, saiu a caminhar com a turma. Ao cair da tarde do
domingo, avisou, dormiria fora, pegou o carro, tomou rumo de Pernambuco. Chegou
conforme combinado, Rosa deu-lhe uma fantasia de mascarado, pulou a noite toda
subindo e descendo as ladeiras de Olinda. Hospedado na casa da namorada, passou
o maior carnaval de sua vida nos braços da morena, fazendo o passo nos acordes
do Vassourinhas, cantando Evocação e o Frevo da Saudade.
Rosa tentou ele ficar na quarta-feira de cinzas no Bacalhau do Batata.
Mas o pavor que tinha da esposa fez com que ele dormisse na terça-feira no
hotel do retiro, assistiu o encerramento. Se a mulher descobre, seria homem
morto.
Até hoje Gal não entendeu o surto de fé de Arnaldo no início
daquele ano. Ele sempre responde: São fases da vida, fases da vida.
Ai meu Deus, essa foi demais...
ResponderExcluirE estava esperando a Gal descobrir alguma coisa... Que sorte, hein!
Pena que nem sempre eu tenha tempo para ler todos os textos...